Enquanto delegações de 175 países membros da Organização Marítima Internacional (IMO, em inglês) discutem qual será o mecanismo para a descarbonização de navios no horizonte até 2050, representantes da indústria de biocombustíveis e cientistas brasileiros estão mobilizados para comprovar a sustentabilidade da produção agrícola nacional.
Na tarde desta quinta (10/4), em Londres, onde ocorre o debate na sede da IMO, a delegação de empresários e pesquisadores apresentou um compilado de mais de 80 estudos internacionais para rebater críticas, especialmente europeias, aos produtos de primeira geração baseados em culturas como cana, milho e soja.
O trabalho liderado pela professora da USP e coordenadora do programa de Pesquisa em Bioenergia Fapesp, Glaucia Souza, traz subsídios para a delegação brasileira na IMO, na medida em que rebate uma das principais críticas ao etanol e biodiesel: a concorrência com a produção de alimentos.
“Estamos oferecendo evidências de que a produção de biocombustíveis não compete com a produção de alimentos”, conta a pesquisadora que também é líder da Força-Tarefa de Descarbonização do Transporte com Biocombustíveis da Agência Internacional de Energia (IEA, em inglês).
É uma corrida contra o tempo para mostrar ao mundo que existem outras soluções para substituir combustíveis fósseis em navios, além dos derivados de hidrogênio que têm ganhado cada vez mais espaço no debate.
Pelo cronograma da IMO, até sexta-feira (11/4) é esperada uma definição sobre o caminho que será adotado para alcançar emissões líquidas zero no setor até 2050. A decisão precisa ser consensual e será obrigatória – muito semelhante ao que ocorreu na aviação civil em 2016.
Há duas propostas principais sobre a mesa: uma taxa de carbono para financiar a transição e um mecanismo de conformidade de flexibilidade, para reconhecer quem investe em combustíveis de baixo carbono.
Defensor do mecanismo de flexibilidade, o Brasil tem se posicionado contra uma taxação por entender que terá um peso maior sobre o frete de longa distância, com impactos econômicos sobre países emergentes, principalmente no Sul Global. Outro ponto de preocupação é com barreiras aos biocombustíveis.
Brasil perdeu o voo, mas não o navio
A mobilização tenta garantir que as especificidades brasileiras e de países emergentes do Sul Global sejam levadas em conta no mecanismo da IMO, evitando acordos que criarão novos custos e mudanças bruscas na produção e consumo desses mercados a partir de uma imposição de tecnologias do Norte.
“A indústria da aviação se organizou antes e pegou os biocombustíveis, e o Brasil em geral, um pouco no contrapé. Quando ela determinou as características e as exigências que ela tem como premissa básica, predominou a ótica europeia. Agora, na IMO, estamos conseguindo chegar junto antes de uma decisão”, comenta Camilo Adas, diretor de Transição Energética da Be8 e um dos revisores do compilado.
A produtora de biocombustíveis anunciou no final de março uma parceria com a Vast, no Porto do Açu, em busca de clientes para o biodiesel no transporte marítimo.
Em entrevista à agência eixos, Adas, que também integra o grupo de trabalho do Ministério da Indústria e Comércio (MDIC) para Transição Energética da Indústria Naval, avalia que o Brasil aprendeu a lição com o esquema da aviação internacional (Corsia) e se reorganizou nos últimos quatro anos para abordar a transição energética justa. Leia a matéria completa
EUA abandonam negociações
O debate sobre a descarbonização marítima também precisará lidar com o efeito Trump. Na quarta (9/4), os Estados Unidos decidiram se retirar das negociações em Londres, em mais uma medida contra a ação climática do presidente republicano.
O governo norte-americano informou ainda que considerará “medidas recíprocas” para compensar quaisquer taxas cobradas de seus navios e incitou outros países a seguirem seu exemplo. (Um Só Planeta)
“Os EUA rejeitam toda e qualquer tentativa de impor medidas econômicas contra seus navios com base nas emissões de GEE ou na escolha do combustível”, informou a administração de Donald Trump, segundo a Reuters.
“Se uma medida tão flagrantemente injusta for adotada, nosso governo considerará medidas recíprocas para compensar quaisquer taxas cobradas de navios dos EUA e compensar o povo norte-americano por qualquer outro dano econômico decorrente de quaisquer medidas de emissões de GEE adotadas”.
Autor/Veículo: Eixos